segunda-feira, 29 de setembro de 2008

Sto. Antão do Tojal - Dia Mundial do Turismo - 28 de Setembro de 2008





Miguel Sousa Tavares





1 Por causa das gravuras supostamente paleolíticas de Foz Côa (algumas desenhadas há 30 anos)
deixou de se fazer uma barragem que era importante para a regularização do Douro; e, por não
se ter feito essa barragem, vai avançar-se agora com a respectiva compensação, que é uma
barragem no Sabor - um dos últimos rios despoluídos e em estado natural do país - que terá
consequências ambientais desastrosas. Mas, na altura, Guterres e Carrilho queriam inaugurar o
seu Governo com uma caução 'cultural', cavalgando uma onda de demagogia imaginada por uma
inteligente máquina propagandística de interessados em arranjar um 'tacho' no futuro Parque
Paleolítico do Côa. "As gravuras não sabem nadar", gritavam eles. E, porque as gravuras não
sabem nadar, destrói-se o rio Sabor.
Tempos depois, foi a vez das pegadas da passagem de um dinossauro na CREL. "Achado
arqueológico de extrema importância", arranjou logo os seus acérrimos defensores. Fez-se então
um túnel, para preservar por cima as marcas indeléveis da passagem do dinossauro
excelentíssimo. Tal como em Foz Côa, as boas almas que se encarregam de desbaratar dinheiros
públicos a qualquer pretexto juraram que o local seria ponto de permanente romaria de
criancinhas das escolas, levadas compulsivamente, e de milhares, milhões de adultos, idos
voluntariamente, em súbito fervor histórico-cultural. E só a chegada do défice evitou que ao
túnel se juntasse ainda um museu do dinossauro. Mesmo assim, milhões e milhões e milhões
depois, duvido que mais de uma dúzia de curiosos por ano se preocupe em ir ver as pegadas do
bicho; e, quanto a Foz Côa, retenho a exclamação sentida de uma habitante local, aqui há tempos:
"Até agora, ainda não ganhámos nada com as gravuras!" Pois não, minha senhora, mas isto de
ganhar dinheiro sem fazer nada, apenas abrindo a torneira do Estado, não acontece todos os
dias.
Agora, li aqui que, por cima da A-24, entre Vila do Conde e Vila Pouca de Aguiar, se fez um
'loboduto', para que os distintos animais (que não se sabe ao certo quantos são) não vejam
interrompidos os seus supostos territórios de passagem na serra da Falperra. Eu acho o lobo um
animal interessante e Deus me livre de não os querer preservar. Mas, francamente, 100 milhões
de euros (20 milhões de contos!) por um 'loboduto' - onde, ainda por cima e segundo
testemunhos locais, é improvável que venha a passar algum lobo, porque não só não se sabe se
eles existem mesmo ali como ainda se sabe que ao lado existe uma pedreira que costuma fazer
explosões - parece-me um bocadinho, como direi, talvez exagerado?... Vamos admitir que existem
por ali dez lobos, a quem aquilo facilita a vida; vamos mesmo admitir que existem vinte: um
milhão de contos por lobo não será de mais? Quantos anos, e sempre com gravíssimos problemas
de saúde e assistência, não teria de viver um português para que o Estado gastasse com ele um
milhão de contos?
Como se conseguiu chegar a este verdadeiro deboche contabilístico? Segundo conta o
'Expresso', da maneira mais simples e mais habitual: através da contratação de estudos e
pareceres técnicos a 'especialistas'. A consultadoria para o Estado - um dos mais prósperos
negócios que existem em Portugal.
2 Pela mesma altura de Foz Côa - governava Guterres e era ministro da Economia Pina Moura -, a
consultadoria externa levou o Estado a celebrar outro extraordinário negócio. Existia uma
empresa privada, a Grão Pará, que parece que tinha o mau hábito de se esquecer de pagar à
Segurança Social. Já uma vez tinha conseguido negociar de forma a que o Estado lhe pusesse as
dívidas a zero, mas, anos depois, estava outra vez na mesma situação. Como resolver o problema?
Por dação em pagamento. Acontece que a dita empresa tinha dois bens, qual deles o mais valioso.
Um era um hotel no Funchal, construído ao lado do que dava para imaginar facilmente que um dia
seria o prolongamento da pista de aterragem do aeroporto. Quando a pista foi mesmo
prolongada, o hotel ficou condenado à falência, porque não há muitos hóspedes que queiram
dormir onde aterram aviões. O outro era o Autódromo do Estoril, onde sucessivas injecções de
dinheiros públicos não tinham conseguido o milagre de o tornar rentável nem sequer de lá manter
a Fórmula 1. E foi com estes dois bens falidos que o Estado se contentou em troca do perdão da
dívida. Na altura escrevi um artigo perguntando como é que um Governo que tudo queria
privatizar se lembrava de 'nacionalizar' um autódromo e como é que o Estado transformava um
crédito num encargo financeiro para si. Respondeu no mesmo jornal o ministro Pina Moura. Dizia
que o autódromo era essencial para o turismo e para o 'interesse público' e que, feitas umas
pequenas obras de melhoramento, logo regressaria a Fórmula 1 e lucros a perder de vista.
Passaram-se dez anos e o Autódromo do Estoril, depois de dezenas de milhões de euros de
dinheiros públicos gastos em melhoramentos, manutenção e honorários dos seus administradores
(e, obviamente, sem jamais voltar a ver a Fórmula 1 ou qualquer coisa que se parecesse), foi esta
semana posto em leilão público por 35 milhões de euros. Não apareceu nenhum interessado. Pelo
que, das duas uma: ou se arrasa e urbaniza tudo aquilo (fazendo mais uma alteração legislativa,
porque os terrenos são de construção proibida), ou teremos de continuar a suportar
eternamente os custos deste brilhante acto de governação.
3 E sabem porque é que estas coisas acontecem? Porque há um poderosíssimo lóbi de
consultadoria instalado à mama do Estado, há anos sem fio, que dita, influencia e condiciona as
decisões dos executivos. Para 2008, o Governo orçamentou 370 milhões de euros (!) para gastar
com eles em "estudos, pareceres, projectos e consultadoria". Eles, quem? Pois, isso é segredo de
Estado, Há um ano que o semanário 'Sol' tenta obter, ao abrigo da Lei de Acesso aos
Documentos Administrativos, a lista dos beneficiários deste bodo. Em vão. O Governo fecha-se
em copas e os tribunais administrativos protegem-lhe a manha. É que, se viesse a público a lista
das eminentes personalidades, dos ilustres técnicos e dos influentes escritórios de advogados e
consultores que entre si fazem assessoria aos governos - seja para comprar armas, submarinos
ou autódromos ou para dar parecer técnico sobre 'lobodutos' ou contratos com Angola -, uma
grossa fatia da respeitabilidade pública desabaria por terra.
Repito o que de há muito venho dizendo: em termos de cidadania, há duas espécies de
portugueses - os que vivem a pagar ao Estado e os que vivem a tirar ao Estado. E o resto é
conversa de comendadores ou de 'benfeitores'.

sábado, 27 de setembro de 2008

Artigo do jornal "Semanário" ... no coments

António Ramalho Eanes, o “anti-devorista”
por Paulo Gaião
2008-09-19 01:20


Ao longo da história portuguesa, muitos heróis fizeram-se pagar em dinheiro pelos serviços em prol da liberdade, não se importando com a questão ética e com o empobrecimento dos cofres públicos. Eanes não.
A recusa de Ramalho Eanes em receber uma indemnização de mais de um milhão de euros por parte do Estado é uma matéria que, num país com uma comunicação social mais independente e sensibilizada para a crise não só económica como moral em que o país se encontra há muitos anos, merecia a entrada de um telejornal. A notícia soube-se no sábado. Em vez de Eanes, os telejonais abriram com Ronaldo no sábado e com Madonna no domingo, sinais da voracidade em relação ao dinheiro, que está na origem da decadência das sociedades modernas, como bem recordou Bento XVI em França, no passado fim-de-semana , e da mediocridade dos tempos, em que são os futebolistas e as estrelas rock que têm génio, como já observava Robert Musil nos anos 30 em relação aos cavalos e, curiosamente, já em relação às estrelas da bola, anunciando o esmagamento da cultura e dos espíritos superiores.
A história conta-se rapidamente. Em virtude de um decreto-lei de 1984, feito no tempo de um governo de Mário Soares, ao que se diz elaborado com propósitos políticos revanchistas, os presidentes da República deixavam de poder acumular a reforma respectiva com quaisquer outras reformas ou pensões do Estado. A lei pareceu feita à medida de Eanes, o único presidente eleito desde 1976 e não com intuitos de moralização pública. Eanes, apesar de bem perceber que a lei era feita à sua medida, dois anos antes de abandonar o Palácio de Belém e não se poder recandidatar, promulgou-a, o que mostra uma elevação de espírito absolutamente ímpar e uma abnegação patriótica única. Cavaco Silva, quando chegou há dois anos a Belém, levou esta questão antiga para resolver. O actual Presidente da República pode ter muitos defeitos mas rege-se por padrões éticos e morais que são muito semelhantes aos de Eanes. Cavaco não descansou enquanto não levou o governo a rever esta injustiça em relação a Eanes. Habituado a ver muitos a serem compensados pecuniariamente sem motivo ou com razões forçadas, Cavaco deve ter achado que com Eanes tinha de se ressarcir uma situação única de injustiça, sendo a única via a patrimonial. Enviados do próprio governo terão falado com a família Eanes em privado. A ideia do executivo era não só alterar a lei, como fazê-lo retroactivamente, beneficiando Eanes e reparando uma injustiça. Porém, Eanes, recusou a indemnização, num valor que, com os juros elevados, lhe daria mais do que uma reforma de Presidente da República.
Num país onde, ao longo de muitos momentos da história portuguesa, até os heróis se aproveitaram desta condição para terem títulos, empregos, indemnizações, Ramalho Eanes é um exemplo único que, quando a história pousar, lá para o final do século XXI, princípios do século XXII, e os princípios mais belos da civilização humana renascerem, há-de ser admirado pela sua rectidão e patriotismo. Por exemplo, os heróis da revolução liberal de 1834, apesar de todo o misticismo que anda à volta do seu papel, aproveitaram a situação para enriquecerem e aumentarem o seu património, à custa dos cofres públicos, com esse escândalo nacional que foi a venda, a troco de títulos de indemnização pelos serviços liberais prestados, de milhares de prédios expropriados às ordens religiosas, num processo que, curiosamente, tem semelhanças com o que aconteceu com o desmantelamento da URSS, quando alguns oligarcas comparam títulos e ficaram detentores de grandes negócios, como o petróleo. Vasco Pulido Valente, num livro que escreveu, chamou-lhes mesmo a estes heróis liberais, que hoje dão nome a muitas ruas de Lisboa, os "devoristas". Após a consolidação da democracia portuguesa, também muitos heróis se aproveitaram da situação para obterem bons cargos, boas pensões, uma boa rede de conhecimentos e influências para os seus negócios, fazendo-se pagar pelo seu papel na defesa da liberdade. Com a entrada de Portugal na economia de mercado, depois das expropriações comunistas do PREC, também se indemnizaram muitos grupos económicos que se consideravam vitimas da situação. O Estado voltou a ficar sacrificado, empobrecendo. Com a agravante de, nalgumas situações, os grupos económicos terem sido reinvestidos nos seus bens e valores e depois terem vendido tudo aos estrangeiros, como aconteceu com a venda do Totta ao Santander, por António Champalimaud.
Eanes, um homem que participou no 25 de Abril e que fez o 25 de Novembro teve tudo nas mãos. Se não fosse a figura ímpar que é, podia ter sido um ditador, espalhando um banho de sangue em Portugal, ou um "devorista", fazendo-se pagar bem caro pelo preço da liberdade e da democracia que garantiu ao país. Não foi uma coisa nem outra. É só um homem íntegro e um Patriota. À semelhança de Eanes, faça-se também justiça aos militares deAbril. Quando se fizer a história, há-de chegar-se à conclusão que poucos enriqueceram, o que é mais um feito notável, num país que quase sempre foi gerido com base num rancho que era preciso servir.

.................POR ONDE ANDEI ....................











Caminhada pela Falésia do Divórcio





Ao participar numa caminhada de Magoito (Sintra) a São Julião (Mafra), deparei com esta linda paisagem. Ainda há agricultores junto das falésias do Magoito !!!